sexta-feira, janeiro 26

Revisitar o acaso generoso

Todos sabemos que existem vários tipos de acaso, mas o que mais me agrada é sem qualquer verosimilhança o acaso generoso.
Hoje pastei, vegetei e ruminei a minha bela rotina. Montei uma velha e ferrugenta prateleira que estava escondida desde a minha nobre saída do seminário. Decidi, dar uma valente volta pela enfermidade da minha humilde casa, tudo isto, porque andava em busca de alguns pequenos fragmentários que eloquentemente alvoravam por corredores fora, quem sabe, também eles nómadas. Percorri léguas afim de preencher a vasta prateleira ferrugenta, encontrei ninhos de víboras, cartas assassinas de um passado vigoroso, livros do antigo regime, e que grande regime… espirrei de alergia, pó e pó, já ao findar do dia, e daquela tarefa da vontade espontânea que ocorrera ao principio da tarde, deporta-me o sentido da curiosidade por uma caixinha de cds em papel, olhei para ela, peguei nela, lia e ri-me: “Guia de Indústrias e Profissionais de Portugal”, voltei a rir-me, e abria na esperança de ter um motivo sólido e pouco sensacionalista de empurrar aquilo para o lixo. Atrapalhadamente, acabara de encontrar o meu perdido cd dos Tindersticks, o álbum era o Donkeys 92 – 97, que lindo, que belo, que sublime. Voltei-me para o acaso, e respondi-lhe:”Obrigado”.

quinta-feira, janeiro 25

Caro Mestre Nietzsche (2-10)

Muito obrigado pelas suas atenciosas palavras de conforto, é nesta distância verbal e corporal que só as palavras fazem sentido, só as palavras constroem a acção do imaginário, e neste preciso caso, da saudade e do conforto, que tanto preciso. Mas deixo o lamurio do meu presente – passado para quando nos reunirmos em alegria e eternidade, será belo, belíssimo, assim o espero.
Amigo, o que lhe proponho no seguimento deste pequeno desabafo tem a ver com a submissão. Infelizmente a nossa civilização está condenada a um preconceito chamado: Conhecimento. Lembro-me de certa altura ter afirmado que: “ vivemos, seguramente, graças ao carácter superficial do nosso intelecto, numa ilusão perpétua: temos então para viver, necessidade da arte a cada instante.” Sim, e é essa mesma arte que ignoramos todos os dias. Por exemplo na minha terra Natal, Santa Comba Dão, as pessoas podem ser explicadas pela seguinte expressão: “Como burros a olhar para um palácio”, e isto porquê, porque lhes falta a sensibilidade da criação. Com isto afirmo piamente que qualquer politico e educador em Portugal é uma circunstancia – superficial, dado que ensina o – outro de uma maneira mecanicista e tecnicista, sem paladar cor ou alento. Vivemos no “mercado” de um conhecimento desesperado. As pessoas tentam devorar sem sentimento uma pérola inigualável, talvez por isso, é que, e peço desculpas pelo atrevimento, é que os seus escritos foram tão mal interpretados, o que deu origem a muitos desastres humanos.
Se hoje viajo até ao México para ver a cultura, ou o que resta dela, é porque tenho sensibilidade e um apetite saudável por tal, mas será que os antigos habitantes dessa mesma cultura teriam a “sabedoria” de apreciar uma aparência duplamente necessária? Duplamente, dado ao conteúdo da contemplação (e lembro-me por exemplos das pirâmides) e ao mesmo tempo do funcionalismo? Se calhar o melhor exemplo é mesmo o da civilização grega e romana, cujas analogias o Senhor tão bem as rutilava. Só assim se percebe o porquê da sua destruição. Lamento, mas a minha civilização está prestes a cometer o mesmo erro.
Somos submissos a um governo que não conhece o seu “povo”, que não se conhece a si mesmo, o abismo é a actualidade. Resta a imagem da aparência, da sobrevivência, eis a minha, a nossa metamorfose.

Saudades G.

quarta-feira, janeiro 24

Caro Mestre Nietzsche (1-10)


Não sei como lhe começar esta carta. Na verdade, ando apreensivo em relação ao meu futuro, falo obviamente do meu futuro profissional, isto porque é na academia que tudo se decide, pelo menos é o que dizem os “sábios”. A minha “filosofia”, aquela que me levou à academia de nada coincide com o que aprendo, uma parte de mim anda atrapalhada com a própria vocação, aquela que Deus me deu mas que teima em não ma apresentar, mas pior que isso, é a lamentável proeza das palavras. As malditas e arrogantes sensações que tenho na consciência não conseguem trespassar o papel fino, e a caneta frágil, essa, teima em não delinear aquilo que eu mesmo conheço. Pior do que o abismo, é sabermos que possuímos algo mas que só lá chegamos intuitivamente, é o fracasso, é o morrer na praia. Se me permite, é caso para dizer que o entendo perfeitamente, quando afirmava: “estou só…só...”, indubitavelmente a humanidade está presa ao massacre da economia selvagem, e visto por esse prisma, eu sou o dono de uma parcela da academia, dado que pago para a frequentar, e que os professores são os meus obedientes, pior é que estou a ser enganado.
Lamento esta minha arrogância, mas é misterioso este mundo.
Estou sem qualquer dependência da filosofia, fui abandonado por mentes indesejadas e perigosas que usam e abusam de uma autoridade nobre. Estou com medo, mas resta-me o suspiro da noite, da solidão.

Seu fiel amigo G.

segunda-feira, janeiro 22

domingo, janeiro 21

Profissão do futuro – Mendigos do Futuro

A profissão do futuro chamar-se-á, Abortistas, ou então, técnicos abortistas, aos que recorrem a estes médicos/técnicos, aliás, chamaremos unicamente Técnicos, dado que, e aí teremos que ir ao pai da medicina, Hipócrates, que e muito bem afirmava: “A ninguém darei por comprazer, nem remédio mortal nem um conselho que induza a perda. Do mesmo modo não darei a nenhuma mulher uma substância abortiva.” Por isso é mesmo recomendável que fique, técnico, e aos que recorrem aos técnicos “do futuro”, vamos chamar de aborígenes, não… não, isso já existe, vamos chamar de abortigenas.
Esperemos é que a economia fique favorável, para que no futuro não vejamos nas ruas, meninas ou casais a pedirem esmola, com os tradicionais cartazes de cartão a dizerem: “Ajude-me, é para Abortar”.

sábado, janeiro 20

Opus XXIII

Beatriz era uma moça pacata, terna para com a família, e gostava muito de ajudar o próximo. Mas o único problema da Beatriz é que era uma esquizofrénica não assumida.
Quando era pequena, Beatriz, matava gatos e enforcava coelhos, na esperança de sentir que naquele momento, naquele preciso momento, havia alguém que estava a sofrer mais do que ela. Beatriz era uma moça engraçada e que cativava todos à sua volta, mas Beatriz, tinha ainda outro problema além de ser uma esquizofrénica não assumida, Beatriz sonhava que os seus problemas podiam ser resolvidos através do conhecimento, ou seja, a Beatriz “sabia” que a resolução dos seus problemas estava precisamente nos livros, era aí que havia a cura para a sua maleita. Ela própria não sabia ainda o que tinha, mas sabia o que a atormentava, mas estava certa que encontraria nos manuais estéreis das bibliotecas alguém parecida a ela, e alguém que tenha ultrapassado o mesmo problema. Foi então que decidiu estudar… estudo nos melhores colégios e nas melhores universidades, acabou, inclusive, com a melhor nota de todo o mundo, mas infelizmente, ela sentia que ainda estava longe da resolução da sua significante vida. Foi na altura de escolher a empresa onde iria trabalhar, que Beatriz conheceu uma rapariga sensacional. Beatriz ao falar com ela, a primeira vez, reparou que o seu entusiasmo pelo conhecimento teórico dos livros estava a ser substituído por uma rapariga, ou seja, Beatriz estava apaixonada, sim apaixonada. Mas por uma rapariga? – Perguntam vocês – Sim, por uma bela e magnifica rapariga. O que mais fascinava Beatriz, era o olhar, e a inteligência descontraída e rebelde que a sua apaixonada transmitia, passaram tempos e tempos a rir e a trocar ideias, parecia que ambas estavam felizes.
Num certo dia, a apaixonada da Beatriz, começou a ficar doente, deprimida, e com falta de cor no seu mundo, ao contrario da Beatriz que parecia que o mundo finalmente lhe tinha dado as resposta todas, a sua apaixonada, entendeu que estava a ser emocionalmente substituída. Foi um choque para ela, coitada. Beatriz tentava encontrar solução para o problema da apaixonada, mas via que dia para dia, ela piorara, a apaixonada estava a morrer envenenada. Beatriz corre para casa da família da sua apaixonada e vê no quintal, um cão preso por uma longa e ferrugenta corrente de ferro, o nome do cão intitulava-se Plebeu. Plebeu era um cão que vivera acorrentado desde que nasceu, era um cão muito especial, porque era muito leal a quem lhe dava comida, e não só, Plebeu respeitava até quando lhe batiam e não lhe davam de comer, Plebeu era um cão muito cativante. Ao aproximar-se, Beatriz, faz uma festinha ao Plebeu e solta o cãozinho, isto porque, Beatriz “sabia” que o Plebeu estava farto de estar acorrentado, e “sabia” que o cão iria ficar muito feliz. O certo, é que o cão foi dar uma voltinha, correu, correu, e até ganiu, mas nunca mais apareceu.

sexta-feira, janeiro 19