terça-feira, agosto 29

“Ode à simplicidade amargurante que contempla de fora o mundo perplexo da exclusão sentimental que não teme em largar a emoção relativizando o poder da amargura infinita do escrever.”
Foi assim que A. da Silva amargurado com a triste vida da sua mulher amada descrevia o real sentimento que pairava no já oco coração. A maior virtude deste jovem senhor de 82 anos era mesmo a da vontade criativa de observar os outros seres.
O mundo amnistiou aquilo que ele mais adorava, a “trotinete” de duas mudanças automáticas. Não foi a trotinete directamente, mas sim a visão. Ficou cego de tanto chorar, os pobres médicos dizem que são cataratas, mas que não compreendem a sua origem, dado que chorar não está nas origens de uma catarata. Uma simples operação seria o suficiente, mas Artur desejaria ficar cego, talvez porque assim o sofrimento e necessidade poderiam ser compensados de uma outra maneira intimista e emocional. Nem com os conselhos do paralítico Sr Henrique, que na verdade só era paralítico porque os músculos das pernas de tão velhos e cansados que estavam, não conseguiam suportar os grandes ossos e grande corpo e assim sendo a cadeira de rodas era a mais preciosa solução para que assim os dois amigos pudessem soletrar o cérebro na mesa de café do café mais perto que tinham na terra.
As tardes destes amigos eram passadas a rir escanzeladamente com as historias que um e outro passaram nos longos tempos dedicados à nação.
O A. Silva foi professor e o Sr. Henrique agente da P.I.D.E, ambos mantinham uma cumplicidade macabra, enquanto que um ensinava o melhor da propaganda científica, académica e nacionalista, um era o gestor daqueles que não cumpriam o seu dever de cidadãos. As histórias eram imensas e delirantes. Cada um tinha a mania de abusar criativamente e ingenuamente dos saberes e funções. O que seria perfeito, era que estas personagens não fizessem parte da ilusão.
Falta pouco para todos nós morrermos, falta muito pouco, e ainda tenho tanta coisa para fazer.
Tem que ser hoje. É mesmo hoje que lhe vou dizer aquilo. Senão terei que esperar que a emoção coronária pare de vez e assim estarei a alterar o que poderia ser o melhor da minha vida, nunca sei quando o melhor é sempre o melhor, sei por exemplo, a nível monetário, quando olho para um contracto e sei se vale a pena ou não, mas em relação à vida, à pura vida que é a minha, isso já não sei. Será problemas de espiritualidade? De medos? Não sei, não quero deixar de ver o que a natureza me deixou, tenho medo, mas quero, vou começar um exercício, a partir de agora, vou ser o mais compulsivo possível, tenho que entrar na harmonia do ser homem e ser animal, tenho que estudar as possibilidades e os riscos, não, não… não pode ser teoria, a teoria estraga a essência magnética do real, tenho que ser mais prático.
Preciso de um mestre.

1 comentário:

Anónimo disse...

A primeira parte do post ilustra o poder magnético existente entre os opostos, que, afinal de contas, não o são assim tanto.
A incerteza que resulta das inúmeras possibilidades que se nos deparam é uma das coisas que torna a vida digna de se viver. A constante surpresa do desenrolar dos acontecimentos sempre novos, ainda que vividos um milhão de vezes,é o que torna a vida fascinante.
A Lei inaugura uma obrigatoriedade:a da decisão, da escolha. Decide e escolhe sem medo. Seja o que for que escolheres, será a melhor resolução possível.